MPLA propõe mais do mesmo

ANGOLA. O próximo dia 23 vai ditar um novo (ou velho disfarçado de novo) Presidente para Angola, depois 38 anos de poder de José Eduardo dos Santos. Os desafios que o país enfrenta são elevados, como o prova a recente descida do “rating” da dívida pública anunciada pela agência de notação financeira Fitch.

A queda do preço do petróleo, a ausência de diversificação económica, o poder excessivo dos militares 15 anos após o fim da guerra civil e a falta de peso da classe média e da sociedade civil na gestão do país são os factores que os analistas apontam como os mais perigosos para a estabilidade de Angola. Mas acima de tudo, a permanência de José Eduardo dos Santos à frente do MPLA e o peso dos seus familiares em empresas decisivas para a economia angolana serão factores que o novo Presidente angolano terá (ou não) de enfrentar logo de início.

Alguns especialistas avaliam que o próximo Presidente angolano, que emergirá das eleições gerais de quarta-feira, poderá enfrentar dificuldades em governar devido ao poder de José Eduardo dos Santos, que permanecerá como líder do MPLA até 2018.

“José Eduardo dos Santos quer afastar-se da Presidência, mas quer manter algum poder sobre a máquina do Estado e sobre o motor económico e político do país”, diz João Paulo Batalha, presidente da associação Transparência e Integridade.

A campanha eleitoral do MPLA é liderada pelo Estado/regime e João Lourenço aparece como cabeça-de-lista e que concorre à eleição por via indirecta para Presidente da República, sendo o sucessor (ou o dilecto seguidor e acólito) indicado por José Eduardo dos Santos.

“Haverá uma mudança histórica com a saída de José Eduardo dos Santos da Presidência, mas este foi um processo de sucessão gerido pelo próprio Presidente, com vontade que parece óbvia de manter algum poder nas sombras através da presidência do partido, que obviamente condicionará muito o papel do Estado” e do futuro Presidente, diz o responsável da Transparência e Integridade.

“Numa primeira fase, vai haver uma continuidade do poder e, depois, um distanciamento que vai correr após 2018 com a retirada de José Eduardo dos Santos de presidente do partido MPLA”, diz Fernando Jorge Cardoso, especialista em estudos africanos.

“O novo Presidente da República, que muito provavelmente será o candidato do MPLA, vai ter pela sua frente, nos primeiros tempos da sua governação, uma situação em que não vai poder mexer muito na estrutura que lhe é deixada, porque tem um contrapoder exactamente ao lado, um contrapoder real”, diz Fernando Jorge Cardoso.

Segundo Fernando Jorge Cardoso, “as condições objectivas do país não vão dar margem de manobra ao novo poder presidencial para poder ganhar um ‘élan’ [impulso] suficiente para resolver as questões graves que o país enfrenta e que não são possíveis de resolver enquanto a principal e quase única fonte de rendimento do Orçamento de Estado vier das receitas do petróleo”.

“É um pouco difícil ter uma perspectiva do que vai acontecer diante de uma situação que nunca ocorreu, já que é a primeira vez que Angola vai a eleições e o Presidente, que esteve muitos anos no poder, não irá concorrer novamente ao cargo”, considera Eugénio Costa Almeida, investigador do Centro de Estudos Internacionais do Instituto Universitário de Lisboa (CEI-IUL).

Fernando Jorge Cardoso diz ainda que João Lourenço “é uma pessoa que vem de dentro do aparelho partidário (…), que é casado com uma ex-ministra das áreas económicas que actuou vários anos e que tem de facto um poder junto às elites da administração pública que é importante, tem também tem um peso político forte”.

“Tem de ser feita uma grande reforma de natureza fiscal e, de facto, tem de haver uma diversificação na economia, com um aumento de investimentos ao nível agrícola”, considera Jorge Cardoso. Para o investigador, “isto [da diversificação da economia] é fácil de dizer e tem sido dito, mas tem de haver quem invista e depois tem de haver quem consuma estas produções a preços competitivos em relação a produções de outros países”.

“O que a diversificação da economia exige são condições muito maiores de pluralismo, de liberdade democrática, de liberdade de investimento, de um sistema de justiça verdadeiramente independente e que funcione eficazmente na resolução de conflitos”, refere João Paulo Batalha.

Folha 8 com Plataforma Macau

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