MPLA não integra, submete

“Revisionismo histórico: promotor da Unidade Nacional, ou instrumento de manipulação e opressão política?” “Dos fracos e vencidos não reza a História”, parece ser o lema principal que orienta a acção política desencadeada pelo MPLA, ao longo da pré-campanha eleitoral, mas também neste “sprint” final, até às eleições de 23 de Agosto próximo.

Por Tchockwe Tchockwe

Que o “M” nunca foi um partido preocupado com a inclusão “dos outros”, tão angolanos quanto os seus próprios militantes, trazendo-os para o palco do debate político consequente, disso ninguém pode ter dúvidas. Entre “integrar” e “submeter”, a escolha tem sempre recaído na 2.ª alternativa. Sem surpresa!

O MPLA sempre cultivou a ideia de que, fora do Partido, “nem inteligência e nem sapiência!” Dito de outra forma, o partido hegemónico em Angola, atento ao seu auto-proclamado papel messiânico, desde cedo incutiu nos seus militantes a crença de que entregar os comandos do País à Oposição, qualquer que ela fosse, seria o mesmo que “abrir as portas do inferno”. Sem o MPLA para nos valer, profetizam os seus dirigentes, restaria apenas um deserto estéril e amorfo, e os angolanos perderiam a sua identidade, tornando-se um povo à deriva, sem futuro e sem esperança. Nada mais falso, meus senhores! Nada mais falso.

A hegemonia opressora do MPLA (partido que criou e desenvolveu, à sua volta, uma aura santificada de infalibilidade) tem condicionado, fortemente, o surgimento e consolidação de uma alternativa sólida de governo, minando a auto-confiança dos agentes políticos da Oposição, “domesticando-os” em certa medida, e adormecendo-os “num sono de benesses e falsas honrarias”. E o medo do desafio de governar a enorme crise angolana, cheia de buracos escuros e de alçapões, adensa-se e toma conta dos líderes da Oposição, que receiam atirar-se à “fogueira”.

E a “obra de regime” do sacro-santo Partido não se fica por aqui.

O despudor inerente ao revisionismo histórico em Angola não incomoda… nunca incomodou a “cadeira do Poder”. Antes pelo contrário. A acção deliberada de falsear a História visa reforçar o “castelo” onde se refugia e prospera a chamada “elite dirigente”. Extirpar do seu sentido maior, por exemplo, o esforço patriótico empreendido pelos demais partidos históricos, que também tiveram o seu quinhão na luta anti-colonialista, significa retirar importância à própria luta armada, e ao sacrifício representado pela morte de milhares de angolanos. Mas também aqui, a necessidade permanente de reafirmação política da “elite dirigente” sobrepõe-se a qualquer outro ditame, não admitindo, à “concorrência”, a veleidade de grandes vôos… nem mesmo históricos.

Por preguiça mental, alguns intelectuais e historiadores angolanos (acríticos, ou mais ou menos a soldo do regime) não se dão, sequer, ao trabalho de consultar, seriamente, as numerosas fontes históricas que retratam um MPLA-guerrilheiro, conduzido com uma visão profundamente autocrática e violenta, e que, uma vez proclamada a Dipanda, logrou trazer para o Estado embrionário que criou e ainda tutela, todos os vícios totalitários dos regimes políticos que o influenciaram.

O Povo angolano sabe quem são os seus verdadeiros heróis, e não os mistura com os “heróis de plástico” apresentados pela propaganda oficial. Digo “verdadeiros heróis” porque também os há fabricados, alindados no seu carácter, despidos das suas contradições e excessos, alguns deles alçados mesmo à condição de semi-deuses… os “eternos libertadores do Povo”, a quem tudo é permitido. E é aqui que reside o problema.

Angola tem sido mergulhada, ao longo das últimas décadas, numa intencional lavagem cerebral, de consequências imprevisíveis para o resgate da Verdade histórica, que se desejaria inclusiva e plural.

Já ao tempo da luta armada, cedo o MPLA revelou o que lhe ia na alma: o seu carácter exclusivista, sectário, defensor da exclusão do “outro”. Por isso, também, ainda que se arvorasse a pertença a um extracto superior de revolucionários, nunca o MPLA se inclinou a construir pontes com outros movimentos nacionalistas, condenando nestes a ousadia de lhe disputarem o título de libertadores e o exclusivismo revolucionário. E a situação mantém-se, 42 anos depois, sem evidência de qualquer vontade de mudança.

Para apagar o contributo dos principais partidos da Oposição da memória das gerações pós-Independência, não é preciso que se fale mal desses patriotas. Basta que, nos livros oficiais adoptados pelas escolas do País, não se fale da sua acção em prol da autonomia da Nação. É, pois, o “apagamento propositado do outro” que nos conduz à situação presente de hegemonia do MPLA na sociedade angolana. O grande culpado da falta de preparação da Oposição para o exercício do Poder é o próprio partido que dela tem beneficiado. Daí a mesquinhez “adivinhada” no slogan do Partido divino: “Ou nós, ou o caos!”

Se hoje “só o MPLA tem obra para mostrar ao Povo”, como disse João “Malandro” num recente comício no Huambo, tal situação é fruto da sistemática desvalorização do papel dos partidos da Oposição ao regime, distorcendo e menorizando a sua representatividade, falseando a Verdade histórica e condicionando as escolhas populares, por forma a eternizar-se no Poder.

A acção propagandística do MPLA, incidente nas populações menos intelectualizadas, nas aldeias, nas pequenas cidades da Angola profunda, nos musseques e junto de algumas faixas do desmesurado funcionalismo público angolano, têm sido sempre no sentido de condicionar o voto popular na sua pluralidade, quer pela criação de um clima psicológico de medo da mudança, quer pelo incentivar de um fenómeno de dependência patológica (muito parecido, nos seus efeitos, à toxicodependência).

No mais íntimo do seu ser, o dirigente do MPLA sente, realmente, que faz parte de uma “casta superior”, a quem foi divinamente atribuída a “missão evangélica” de tomar conta de Angola e dos seus Povos, dos negócios do Estado e da Arca do Tesouro nacional.

O regime despótico do MPLA criou um monstro, que o pré-anunciado vencedor das pseudo-eleições de 23 de Agosto próximo não tem a certeza de conseguir dominar.

Concluamos com uma previsão: a queda futura do regime vigente, longevo de 42 anos, arrastará, inevitavelmente, o reescrever da História de Angola, libertando-a das carregadas cores dogmáticas e ideológicas impostas pelo MPLA, dessa forma permitindo que as novas gerações tenham acesso, finalmente, à Verdade histórica. Que assim seja!

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One Thought to “MPLA não integra, submete”

  1. Carlos Keyne

    MPLA é promotor da unidade Nacional, disso não há dúvidas.

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