Ensino superior em Angola:
Quantidade ou qualidade?

O vice-Presidente de Angola, Manuel Vicente, exortou hoje as 65 instituições de ensino superior do país a promoverem a qualidade e valorização do corpo docente como objectivo para o novo ano académico, que arrancou hoje oficialmente. Na teoria, como sempre, estamos bem. Falta o resto.

Segundo dados divulgados por Manuel Vicente no acto oficial de abertura do ano académico de 2017, que decorreu hoje no Caxito, província do Bengo, as 24 universidades públicas e 41 privadas disponibilizaram este ano 111.086 vagas para o ensino superior.

Com as vagas ainda em fase de preenchimento, o vice-Presidente da República recordou que em 2016 estavam inscritos no ensino superior em Angola 241.284 estudantes, um aumento de 9,2% face ao ano anterior.

“O ensino superior tem conhecido um crescimento quantitativo notório. É de salientar, no entanto, que o crescimento quantitativo que se verifica deve ser acompanhado de um esforço que promova a qualidade”, exortou Manuel Vicente. Ora é está. Quantidade não é sinónimo de qualidade. Mas será que essa constatação é para levar em conta?

Em 2015 saíram das universidades e institutos superiores angolanos mais de 14.000 licenciados, um crescimento de 18,9% face ao ano académico anterior, com o governante a sublinhar a necessidade de uma aposta na “valorização dos recursos humanos”, nomeadamente ao nível dos professores.

“É essencial dotar cada instituição de ensino superior de um corpo docente forte, engajado e comprometido, técnica e profissionalmente, que se desenvolva com os demais níveis do sistema de educação e ensino”, disse Manuel Vicente.

“Para que os resultados sejam, a breve trecho, cada vez mais evidentes e significativos”, acrescentou.

O Governo angolano prevê gastar 80.570 milhões de kwanzas (mais de 460 milhões de euros) com o ensino superior público em 2017, o equivalente 1% de todas as despesas orçamentadas para este ano, um aumento de quase 20% face a 2016.

Num universos em que o país tem 20 milhões de pobres, cerca de 10 milhões de angolanos frequentam actualmente – de acordo com dados oficiais – as escolas e universidades do país, nos vários níveis de ensino.

E por falar em qualidade no ensino

Em 2011, na altura das actividades relativas aos 100 anos da Universidade do Porto (UP) uma delegação angolana visitou esta Universidade. Deram-se passos importantes ao nível da cooperação. Mas muito, muito mesmo, ficou por fazer. Ao que parece, Luanda quer – por exemplo – formar engenheiros mecânicos em Cuba que, nesta matéria, é uma verdadeira (im)potência mundial…

Na sequência da criação de oito regiões académicas em Angola, deslocaram-se à UP alguns dos reitores dessas novas universidades, assim como técnicos ligados ao ministério que tutela o ensino superior em Angola. Foram pedir ajuda e solicitar cooperação entre a UP (de facto fizeram um périplo por Portugal e visitaram diversas universidades) e essas novas universidades.

“Naquela altura tinha algum tempo disponível e ao ver a notícia do pedido de ajuda dos meus patrícios (sou natural de Luanda) conversei com o Presidente do Departamento de Engenharia Mecânica (DEMEC) da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) e fomos falar com o Vice-Reitor da UP que tratava da Cooperação”, contou, em Fevereiro de 2015, ao Folha 8 Carlos Pinho, professor da FEUP, acrescentando que “ele disse-nos que o assunto iria muito certamente ser tratado a nível central, nomeadamente do CRUP (Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas).”

“Eu disse ao Vice-Reitor da UP para a Cooperação que ele iria esperar sentado, porque daquela rapaziada do CRUP e de Lisboa não sairia nada de jeito em tempo oportuno, e pedi-lhe autorização para, como professor da FEUP e na condição de natural de Angola, eu tentar por minha iniciativa, responder a pelo menos duas dessas universidades. Expliquei-lhes, ao Vice-Reitor e ao Director do DEMEC, que do pondo de vista da Engenharia Mecânica interessava-nos o corredor do Lobito”, continuou Carlos Pinho.

“Mas não só à Engenharia Mecânica pois aquilo combinava tudo o que dissesse respeito à engenharia: Agronomia (Huambo e Bié), Portos (Engenharia Civil – Lobito), Benguela (CFB- Engenharias Mecânica e Electrotécnica), no futuro Engenharia Química (porque se previa a construção de uma refinaria do Lobito), etc.”, explicou Carlos Pinho, acrescentando que “tive luz verde do Vice-Reitor e do Director do DEMEC e posteriormente do Director da FEUP, que é o actual Reitor da UP.”

Habituado a meter mãos á obra, Carlos Pinho escreveu aos Reitores da Universidade José Eduardo dos Santos – UJES (Huambo) e Katyavala Bwila – UKB (Benguela) “a propor os nossos préstimos na elaboração dos planos de estudo dos vários cursos de engenharia que desejassem.”

Tudo corria bem: “Tive respostas positivas das duas universidades mas principalmente da UKB”.

Foram então criadas equipas na FEUP e propostos planos de estudos para vários cursos, Mecânica, Civil e Química e mais tarde Electromecânica.

Carlos Pinho conta que “o que interessava mais à UKB (e concretamente ao Instituto Politécnico do Lobito – IPL) de imediato, era o curso de Mecânica. Trabalhamos em conjunto e o pessoal do IPL da UKB conseguiu ter pronto no início de 2012 um plano de estudos que enviou para aprovação, para o ministério competente em Luanda.”

“As coisas correram tão bem com esta interacção entre a FEUP e a UKB (e em certa medida com a UJES) que as duas universidades convidaram uma equipa da UP a deslocar-se às duas cidades, o que aconteceu em Dezembro de 2011, quando um grupo de professores da UP passou uma semana em Angola.”

Mas…

“O problema é que o dossier que foi enviado para Luanda ficou perdido lá pelo ministério, de tal modo que já foram enviadas pelo menos mais três cópias do mesmo, a ver se a maldita aprovação acontece. Mas nada”, lamentava Carlos Pinho.

Entretanto a UKB lá começou (em 2012, mesmo sem autorização) o curso de Engenharia Mecânica, de tal modo que no ano lectivo de 2014/2015 mandou para o Porto cinco dos seus melhores alunos a ver se eles lá completavam o curso, pois não havendo aprovação do curso pelo governo, a continuação destes jovens em Angola seria um tiro no escuro.

“A UP, ao abrigo de um protocolo assinado ente a UP e a UKB e ainda entre o IPL e a FEUP, abriu vagas para estes cinco alunos e eles para cá vieram. Pretende-se que sejam cinco futuros docentes do curso de Engenharia Mecânica da UKB. Estamos todos a torcer por isso, embora estejamos a constatar com tristeza que a sua formação de base é fraca e que eles têm imensas dificuldades em acompanhar o nosso ritmo de trabalho”, relatava Carlos Pinho em Fevereiro de 2015.

Mas há mais. “A cooperação com a UJES (em termos de Engenharia Mecânica) não deu grande coisa, o curso de Mecânica que eles se propuseram fazer está baseado no leccionado na Universidade Agostinho Neto e não é mais do que o antigo curso da Universidade de Luanda (onde eu estudei até ao 3º ano), o qual está baseado na reforma do Veiga Simão. Ou seja é um curso que na sua génese tem por base um plano de estudos com 50 anos!!!”, desabafava num sentido lamento Carlos Pinho.

“Por outro lado, já o plano de estudos que propusemos à UKB, e que eles aceitaram, teve por base um estudo que estávamos na altura a fazer e que levou igualmente à reformulação do plano de estudos, do nosso curso de Engenharia Mecânica aqui na UP”, esclarece o docente da FEUP.

Diz Carlos Pinho que, “nesse estudo de suporte do novo plano de estudos, analisamos os cursos das melhores universidades do mundo. O plano de estudos proposto, sem paternalismos, pela UP à UKB, levava em consideração as regras do processo de Bolonha, ou seja propusemos algo devidamente avançado e ao nível do que se faz de melhor no mundo e já a pensar em futuros processos de equivalência de graus entre os diversos países e que, na sua essência, era o mesmo que queríamos para o nosso nova plano de estudos.”

Com satisfação, Carlos Pinho dizia que “o pessoal do IPL da UKB foi impecável e demonstrou empenho, profissionalismo e competência na preparação e implementação do mesmo, mas tem esbarrado com a inépcia de Luanda, pois não há nenhuma resposta ao pedido de aprovação/homologação do curso”.

Neste contexto, o que se teme é que com a psicose oficial pelo sistema de ensino de Cuba, Angola opte mais uma vez por ter clones cubanos e fazer de professores. E como Cuba é uma potência mundial em Engenharia Mecânica, a coisa promete…

Folha 8 com Lusa

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One Thought to “Ensino superior em Angola:
Quantidade ou qualidade?”

  1. Fernando

    Que o próximo Ministro reabra o ISGEST- INSTITUTO SUPERIOR DE GESTAÕ LOGISTICA E TRANSPORTES que ENCONTAR-SE FECHADO ABANDONADO A SER USADO PARA AS SUAS REUNIÕES A 2 ANOS. DEIXANDO os estudantes que ja tinha feito 2 anos apagarem 300 USD mensais A DEUS DARÁ.

    HAJA RESPONSABILIDADE E BOM SENSO PELO MENOS UMA VEZ..!!!

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