Dia do herói do MPLA

O dia 17 de Setembro, data de nascimento de um dos fundadores e primeiro presidente da República de Angola, António Agostinho Neto, é considerado pelo MPLA como Dia do Herói Nacional do MPLA (Dia do Herói Nacional de Angola terá, com certeza, de ser alguma coisa bem diferente), devido – diz o regime – ao seu contributo na luta armada contra o colonialismo português e pela conquista da independência nacional. Quanto ao resto… passam uma esponja. Passa o MPLA, não passam os angolanos.

A efeméride, instituída feriado nacional em 1980 pela então Assembleia do Povo, um ano após o seu falecimento, em 10 de Setembro de 1979 na antiga União das Republicas Socialistas Soviéticas, deve-se, também, sempre segundo o MPLA, ao reconhecimento do seu empenho na libertação de Angola, em particular, e do continente africano.

Fruto da sua entrega à causa libertadora dos povos, o Zimbabwe e a Namíbia ascenderam igualmente à independência, assim como contribuiu para o fim do Apartheid na África do Sul, afirma o MPLA.

Quanto a ter sido o principal responsável pelos milhares de mortos angolanos (quase todos do próprio MPLA) nos massacres de 27 e Maio de 1977… nem uma palavra, como convém a um regime que nasceu para se servir do Povo, dos escravos, e não para o servir.

“Agostinho Neto foi também um esclarecido homem de cultura, para quem as manifestações culturais tinham de ser antes de mais a expressão viva das aspirações dos oprimidos, arma para a denúncia dos opressores, instrumentos para a reconstrução da nova vida”, escreve a Angop. Respeitando as vítimas do 27 de Maio e os seus familiares, os oprimidos (os 20 milhões de pobres que Angola tem, por exemplo) podem rir-se com esta anedota.

Angola continua a ser (re)construída à imagem e semelhança do MPLA, como se fosse um regime de partido único. E, de facto – que não de jure –, é isso mesmo.

Se o MPLA é Angola e Angola é o MPLA, herói nacional há só um, Agostinho Neto e mais nenhum. Quando o MPLA for apenas um dos partidos do país e Angola for um verdadeiro Estado de Direito, então haverá outros heróis.

Até lá, os angolanos continuarão sujeitos à lavagem do cérebro de modo a que julguem que Agostinho Neto foi o único a dar um contributo na luta armada contra o colonialismo português e para a conquista da independência nacional.

Pelos vistos, desde 1961 e até agora que só existe Agostinho Neto. Se calhar até é verdade. Aliás, bem vistas as coisas, Holden Roberto e Jonas Savimbi, FNLA e UNITA, nunca existiram e são apenas resultado da imaginação de uns tantos lunáticos. E se existiram não eram certamente angolanos…

Continuemos a ver a lavagem cerebral (educação patriótica, segundo o regime) – bem visível desde há 42 anos em todo o país – que o regime do MPLA pretende levar a cabo: “Dotado de um invulgar dinamismo e capacidade de trabalho, Agostinho Neto, até à hora do seu desaparecimento físico, foi incansável na sua participação pessoal para resolução de todos os problemas relacionados com a vida do partido, do povo e do Estado”.

Numa coisa a cartilha do MPLA tem toda a razão e actualidade: “como marxistas-leninista convicto, Agostinho Neto reafirmou constantemente o papel dirigente do partido, a necessidade da sua estrutura orgânica e o fortalecimento ideológico, garantia segura para a criação e consolidação dos órgãos do poder popular, forma institucional da gestão dos destinos da Nação pelos operários e camponeses”.

Como se vê, os destinos da Nação estão entregues desde 11 de Novembro de 1975 aos operários e camponeses do tipo José Eduardo dos Santos, Sonangol & Fundo Soberano Lda.

Em reconhecimento da figura do (suposto único) fundador da Nação angolana, estão erguidas em vários pontos do país estátuas, que simbolizam os seus feitos e legados, marcados pelas suas máximas “De Cabinda ao Cunene um só povo e uma só nação” e “O mais importante é resolver os problemas do povo”.

Pois! Os problemas do povo não foram resolvidos. Mas as estátuas aí estão para serem vistas por um povo que continua a ser gerado com fome, a nascer com fome e a morrer pouco depois com… fome.

No dia 12 de Agosto de 2009, o inspector-geral das Forças Armadas Angolanas, general Rafael Sapilinha “Sambalanga”, considerou na comuna do Icolo e Bengo, Angola como uma “trincheira firme na defesa do continente africano”, pelo percurso árduo nas lutas de libertação nacional, bem como o contributo para a paz na região.

Poderia o general “Sambalanga” ficar-se por aqui e tudo estaria bem. Angola é de facto uma “trincheira firme na defesa do continente africano”.

Rafael Sapilinha, que falava durante a visita dos Inspectores de Defesa da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) ao Centro Cultural “António Agostinho Neto”, não se conteve, contudo, em querer agradar ao chefe e vai daí enalteceu o espírito de coragem do fundador da nação MPLA, nas lutas de libertação nacional que culminou com a independência do país.

Para o inspector-geral, António Agostinho Neto teve a capacidade de prever a liberdade e autonomia do povo angolano nos poemas que escrevia. “António Agostinho Neto não é tido apenas como fundador da nação e do MPLA, mas também como um poeta perspicaz”, sublinhou.

Irra! Apre! Chiça! Por que carga de água Agostinho Neto é o único fundador da nação angolana? E então Holden Roberto? E então Jonas Savimbi?

Que país é Angola que tem tanta dificuldade em reconhecer a Holden Roberto, como a Jonas Savimbi, o estatuto de Herói Nacional? Porque razão, o Estado teve e tem tanta necessidade de humilhar Holden Roberto e Jonas Savimbi? Será assim que se luta pela instituição de um Estado de Direito?

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