Vão em paz e… não chateiem

Familiares dos 17 activistas angolanos a cumprir penas de dois a oito anos de prisão foram hoje informados pelo presidente do Tribunal Supremo que o pedido de ‘habeas corpus’, para os libertar, está em análise no Tribunal Constitucional.

O grupo, que se deslocou até ao Tribunal Supremo sem prévia comunicação/autorização, foi recebido ao fim de três horas e de ter cumprido com algumas formalidades, como a entrega de uma carta, escrita na hora, com o pedido de audiência. Os súbditos de sua majestade não brincam (isto é como quem diz!) em serviço.

Ao grupo foi solicitado a escolha de dois representantes, recebidos pelo presidente do Tribunal Supremo, Manuel Aragão, num encontro que durou cerca de uma hora.

Em declarações à imprensa no final da audiência, Esperança Gonga, mulher do activista Domingos da Cruz, a cumprir a pena máxima de oito anos e seis meses, por supostos e nunca provados actos preparatórios para uma rebelião e associação de malfeitores, disse que valeu a persistência, mas a resposta não foi satisfatória.

“Na verdade, ele disse que o processo não se encontra no Supremo, mas sim no Constitucional e que batemos à porta errada. Nesse caso, vamos é bater à porta certa, porque parados também não vamos ficar”, disse Esperança Gonga.

A mulher do activista e porta-voz do grupo disse que querem respostas sobre a demora ao pedido de “habeas corpus”: “É suposto responder-se com celeridade ao processo e não é o que está a acontecer e nós estamos deveras chateados e angustiados também”, frisou, acrescentando que valeu a persistência dos familiares, “porque é sempre bom estar diante do juiz presidente do Tribunal Supremo, para saber concretamente o que é que se está a passar com o processo”.

Por sua vez, Gedeão dos Santos, pai de Hitler Samussuku, activista que cumpre a pena de quatro anos e seis meses de prisão efectiva, disse não ter ficado satisfeito com a resposta, reforçando a posição de se recorrer ao Tribunal Constitucional.

“São coisas faladas para nos acalmar, mas como pai, olhando para a realidade, é aquilo que temos estado a dizer, que os miúdos foram acusados por uma coisa e condenados por outra. Alguém de direito deve dizer alguma coisa, por isso entendemos como pais atacar estas instituições”, salientou.

Segundo Gedeão dos Santos, o objectivo é fazer ver a estas instituições que a condenação dos jovens está eivada de “erros”.

“Fomos para o Tribunal Supremo, depois vamos também para o Constitucional, levando a nossa mensagem do erro que está visivelmente reconhecido, não só, por angolanos, mas por todo o mundo que nos assiste. Portanto, nós não vamos parar, vamos continuar para que a justiça seja feita”, disse.

A defesa dos activistas apresentou um “habeas corpus” no Tribunal Supremo em finais de Março, pedindo que os seus clientes aguardassem a decisão do recurso em prisão domiciliária.

Os 17 activistas, 15 dos quais estavam em prisão domiciliária e duas em liberdade, foram condenados a 28 de Março, a penas de prisão efectiva entre dois anos e três meses e oito anos e seis meses, por – repita-se – supostos e não provados actos preparatórios para uma rebelião e associação de mal feitores.

Na última sessão do julgamento, o Ministério Público deixou cair a acusação de actos preparatórios para um atentado ao Presidente e outros governantes, apresentando uma nova de associação de malfeitores, sobre a qual os activistas não chegaram a apresentar defesa, um dos argumentos dos recursos.

O tribunal do regime, numa decisão unilateral e sem direito a contraditório, deu como provado que os acusados formaram uma associação de malfeitores, pelas reuniões que realizaram em Luanda entre Maio até 20 de Junho de 2015, altura em que foram detidos, em mais uma sessão de formação que tinha como base o livro de Domingos da Cruz “Ferramentas para Destruir o Ditador e Evitar uma Nova Ditadura”.

Num plano desenvolvido em co-autoria, pretendia – concluiu o tribunal do regime – destituir os órgãos de soberania legitimamente eleitos, através de acções de “Raiva, Revolta e Revolução”, colocando no poder elementos da sua “conveniência” e que integravam a lista para um “governo de salvação nacional”.

Governo de salvação que, segundo os delírios etílicos e canibalescos do regime, incluía: Presidente Interino da República: José Kalupeteka, Alexandra Simeão, Fernando Macedo, Teodoro Obiang, Kim Jong-un, Vladimir Putin, João Pinto. Vice-presidente Interino: Justino Pinto de Andrade, Mihaela Weba, Luvualu de Carvalho.

E ainda – Ministério da Defesa: Abílio Kamalata Numa, Santos Kangamba, Geraldo Sachipengo Nunda. Ministério da Justiça e Direitos Humanos: Rafael Marques de Morais, Kundi Paihama, João Maria de Sousa. Ministério da Saúde: Luís Bernardino, Carlos Alberto Masseca. Ministério da Educação: Carlinhos Zassala, Narciso Damásio dos Santos Benedito. Ministério da Economia: Carlos Rosado, Laura de Alcântara Monteiro, Kiala Ngone Gabriel. Ministério dos Petróleos: Filomeno Vieira Lopes, Aníbal Octávio Teixeira da Silva, José Gualter dos R. Inocêncio. Ministério da Comunicação Social: Reginaldo Silva, Manuel da Conceição, José Ribeiro, Artur Queiroz. Ministério da Cultura: Makuta Nkondo, MCK, Cornélio Caley, Sindika Dokolo.

E também, Ministério da Juventude: João Paulo Ganga, Albino José da Conceição. Ministério dos Antigos Combatentes: Ngola Kabango, Clemente Cunjuca. Ministério da Reinserção Social: José Patrocínio, Mateus Miguel Ângelo, Maria da Luz Magalhães. Ministério da Agricultura e Desenvolvimento Rural: Fernando Pacheco, José Amaro Tati, André de Jesus Moda. Ministério do Empreendedorismo e Combate à Pobreza: Nelson Pestana Bonavena, Isabel dos Santos. Ministério do Interior: Fernando Heitor, Eduardo Filomeno Barber Leiro Octávio, Higino Carneiro. Ministério da Energia e Águas: Luís Filipe da Silva, Joaquim Ventura.

Por fim, Ministério das Finanças: Tina Abreu, Valentina Filipe, José Filomeno de Sousa dos Santos. Ministério do Ambiente: Vladimir Russo, Syanga Kivuila Samuel Abílio, Carlos Seka Kunene. Ministério da Construção e Obras Públicas: Aníbal Rocha, Hugo Miguel Évora Gonçalves, António Teixeira Flôr. Ministério da Geologia e Minas: Miguel Bondo Júnior, João de Matos. Ministério dos Desportos: Albino José da Conceição, Pedro Manuel Mambo Torres. Ministério da Família: Katila Pinto, Ana Paula Silva do Sacramento Neto, Zungueira Salomé. Ministério da Segurança Social: Zé Dáka o Meu, Gertrudes Malaka. Ministério das Pescas: Victória Francisco Lopes Cristóvão de Barros Neto, José Carlos Bagre, Sebastião Sardinha. Ministério do Planeamento: Fanuel da Tribo de Ezer, Eduardo Breno Lemos dos Santos. Ministério da Administração do Território e Urbanismo: Elias Isaac, Joseana Lemos dos Santos. Ministério do Turismo: José Avelino Gourgel dos Santos. Ministério dos Transportes: José João Kuvíngua, Evaristo Valdemar Aristides.

Folha 8 com Lusa

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