Somos um país (ir)real

O MPLA, reconheça-se, continua a querer transformar a Angola deles num país desenvolvido e de referência em África e no Mundo. Estão no poder há 40 anos, mas isso é muito pouco. Sua majestade o rei de Angola, José Eduardo dos Santos, ainda tem muito para roubar ao seu Povo.

Por Orlando Castro

Em abono da sua perpetuação no poder, o MPLA aponta alguns índices que são claros: por cada 1.000 nados vivos morrem em Angola 156,9 crianças até aos cinco anos, apresentando por isso a mais alta taxa de mortalidade mundial em 2015. Em cada 100.000 nados vivos em Angola morrem 477 mães. A esperança média de vida à nascença em Angola cifrou-se nos 52,4 anos, apenas à frente da Serra Leoa, com 50,1 anos. A expectativa de uma vida saudável à nascença é de apenas 45,8 anos, igualmente uma das mais baixas do mundo.

Perante isto, é óbvio que o MPLA e o seu “querido líder” precisam de, numa primeira fase, estar no poder mais uns 40 anos. Numa primeira fase, é claro. Se nos 40 que já levam no poder conseguiram em muitos parâmetros pôr Angola em valores piores dos que se registavam na era colonial, ainda têm muito trabalho pela frente.

Ficam, contudo, algumas dúvidas. Se a Angola (deles) é, por força da impoluta governação do MPLA que já dura desde 1975, uma referência em todo o Mundo e arredores, como defendem os acólitos do Rei, que mais poderá fazer sua majestade José Eduardo dos Santos.

É que a Angola (deles) é mesmo uma nobre e incólume referência mundial, graças exclusivamente ao MPLA e à liderança do “querido líder” José Eduardo dos Santos que, por ser divina, já dura desde 1979 sem carecer de qualquer eleição nominal. Não fossem as suas instruções e o MPLA teria em todas as eleições mais de 100% dos votos.

Com 70% da população afectada pela pobreza, com uma taxa de mortalidade infantil a bater todos os maus recordes, a Angola (a nossa) é uma referência em África, no Mundo e – seguramente – arredores.

Outros indicadores, basilares para que Angola (a nossa) seja a tal referência, revelam que apenas 38% da população angolana tem acesso a água potável e que somente 44% dispõe de saneamento básico, que apenas um quarto da população tem acesso a serviços de saúde que, na maior parte dos casos, são de fraca qualidade.

Mas há mais dados que revelam toda a capacidade que Angola (a nossa) tem, graças ao MPLA e ao seu líder – “o escolhido de Deus”- para ser um paradigma pelo menos africano e mundial: 12% dos hospitais, 11% dos centros de saúde e 85% dos postos de saúde existentes no país apresentam problemas ao nível das instalações, da falta de pessoal e de carência de medicamentos.

Quem não se recorda de, em Agosto de 2012, por exemplo, os centros de saúde dos bairros Bula-Matady, Nabamby e o Hospital Municipal do Lubango, no bairro da Mitcha, na capital da província de Huíla, terem solicitado às parturientes que se fizessem acompanhar de velas para a sua assistência, devido às falhas de energia e à falta de geradores?

Mas em abono dessa divina governação do MPLA jogam outros factores que fazem de Angola (a nossa) a tal referência africana e mundial: a taxa de analfabetos é bastante elevada, especialmente entre as mulheres, uma situação que é agravada pelo grande número de crianças e jovens que todos os anos ficam fora do sistema de ensino, bem como a certeza de que as crianças angolanas sofrerem de má nutrição crónica.

Em abono dos altos serviços prestados pelo regime, recorde-se a dependência sócio-económica a favores, privilégios e bens que é o método oficial do regime para amordaçar os angolanos ou, ainda, que 80% do Produto Interno Bruto angolano é produzido por estrangeiros; que mais de 90% da riqueza nacional privada é subtraída do erário público e está concentrada em menos de 0,5% da população; que 70% das exportações angolanas de petróleo tem origem em Cabinda.

Também não seria descabido lembrar que o acesso à boa educação, aos condomínios, ao capital accionista dos bancos e das seguradoras, aos grandes negócios, às licitações dos blocos petrolíferos, está limitado a um grupo muito restrito de famílias ligadas ao regime no poder.

É claro que não se pode esquecer a aposta, desde sempre, do Executivo na diversificação da economia para que o país deixe de depender exclusivamente do petróleo e dos diamantes e, mais importante do que tudo isso, que o MPLA, ao longo da sua trajectória, cumpriu os seus princípios ideológicos, enraizando-se no povo e tornando-se “numa força respeitada em Angola, em África e no Mundo”.

Em síntese. Antes do MPLA a Angola (deles) não existia. A outra Angola (a nossa), essa sempre existiu.

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