Renamo (armada) trava ditadura da Frelimo

No dia 9 de Maio deste ano, o ministro das Relações Exteriores de Angola, Georges Chikoti, apontou em Maputo a via negocial como solução para a crise política e militar em Moçambique, exortando a Renamo, principal partido de oposição moçambicana, a aceitar o diálogo.

Por Orlando Castro

A opção formal do MPLA era, assim, diferente da que praticou em Angola, onde a via negocial e o diálogo só foi, de facto, implementada a partir do momento em que decapitou a UNITA, primeiro comprando alguns generais das FALA e depois assassinando Jonas Savimbi.

Em Moçambique a Frelimo (contrariando as teses do MPLA) não decapitou a Renamo nem assassinou o seu líder, Afonso Dhlakama. Talvez por isso, com todos os riscos e contratempos que se conhecem, o país está mais perto da democracia, mais longe da ditadura do que Angola.

Basta, por exemplo, ver que ao contrário de Angola, Moçambique teve já vários presidentes da República: Samora Moisés Machel (25 de Junho de 1975 a 19 de Outubro de 1986); Joaquim Alberto Chissano (6 de Novembro de 1986 a 2 de Fevereiro de 2005); Armando Emílio Guebuza (2 de Fevereiro de 2005 a 15 de Janeiro de 2015) e o actual Filipe Nyusi.

“O problema que se vive em Moçambique preocupa todos, particularmente a nossa região [África Austral]. Temos trocado impressões com o Governo moçambicano, que até aqui nos parece ter apresentado uma boa via, que é a via negocial”, afirmou Georges Chikoti.

A normalização da situação político-militar em Moçambique, insistiu o chefe da diplomática angolana, passa pela aceitação do diálogo por parte do líder da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), Afonso Dhlakama.

Passa, é certo. Mas também passa pela certeza de que, mesmo diminuído na sua força bélica, Afonso Dhlakama ainda consegue dizer e mostrar à Frelimo o que ninguém na UNITA consegue dizer e mostrar ao MPLA.

Não existisse a Renamo com a força militar que (ainda) tem e há muito que Moçambique seria uma cópia rigorosa – embora mais pobre – do que é hoje Angola. Um reino dirigido por um déspota.

“Acho que o Governo moçambicano indicou as bases para esta negociação, queremos esperar que o senhor Dhlakama responda à proposta de formação de uma equipa técnica que o Governo de Moçambique já indicou e a Renamo tem de indicar a sua equipa técnica para essas negociações se iniciarem”, declarou Georges Chikoti.

Sobre a possibilidade de Angola assumir algum papel numa eventual retomada do processo negocial em Moçambique, o ministro das Relações Exteriores de Angola fez depender essa acção de um pedido das autoridades moçambicanas.

“Angola só pode consolidar, apoiar a iniciativa que o Governo de Moçambique já fez e esperarmos que esta iniciativa produza resultados. Se houver mais algo a fazer, certamente que o Governo de Moçambique, que tem boas relações connosco, irá nos indicar qual é o caminho”, declarou Georges Chikoti.

E o que poderá o governo moçambicano pedir a Angola que não passe pela adopção do mesmo plano que o MPLA utilizou para acabar com a UNITA?

Moçambique tem conhecido nos últimos meses uma escalada de crise militar, no centro do país, devido a confrontos entre as Forças de Defesa e Segurança (Frelimo/Governo) e homens armados da Renamo, assassínios políticos e ataques atribuídos ao maior partido de oposição em vários troços da principal estrada do país.

São incidentes graves. São. Mas isso mostra à Frelimo que, pelo menos por agora, não é dona de todos os moçambicanos. Ainda há quem resista. Ainda há quem, ao contrário da UNITA, não trocou a mandioca pela lagosta. Ainda há quem prefira ser livre do que escravo.

A Renamo recusa-se a aceitar os resultados das eleições gerais de 2014, ameaçando governar nas seis províncias onde reivindica vitória no escrutínio.

A outra face dos factos

Recorde-se que a Renamo acusou no dia 25 de Novembro de 2015 o Governo da Frelimo (tal como o MPLA, no poder desde a independência) de pretender “imitar a solução angolana”, por tencionar eliminar o líder do movimento, Afonso Dhlakama, tal como aconteceu com Jonas Savimbi, presidente da UNITA.

“Manter a paz será através da imitação do modelo angolano, como o [Presidente moçambicano] Filipe Nyusi fez saber, quando manifestou a sua admiração pela solução angolana?”, questionou José Cruz, deputado e relator da bancada da Renamo, numa pergunta do seu grupo parlamentar ao Governo.

Na sua mais recente visita a Angola, Filipe Nyusi apontou Angola como exemplo pelo facto de o principal partido do país não estar armado, uma situação que não se verifica em Moçambique, dado que a Renamo mantém um contingente armado desde a assinatura do Acordo Geral de Paz em 1992.

O relator da bancada da Renamo repetiu as acusações anteriormente feitas pelo principal partido de oposição moçambicana de que o Governo pretende eliminar o líder do movimento, tal como aconteceu com Jonas Savimbi, líder da UNITA, que morreu em combate em Fevereiro de 2002, num cerco montado por alguns dos seus antigos generais.

“O Governo declarou guerra ao anunciar o desarmamento da Renamo e tem vindo a adquirir armamento numa estratégia que inclui a morte de Afonso Dhlakama”, frisou o relator da bancada da Renamo.

Na altura, o deputado e porta-voz da Renamo, António Muchanga, afirmou que o Governo moçambicano viu-se obrigado a recuar na intenção de desarmar o movimento devido ao que definiu como derrota que as forças de defesa e segurança moçambicanas têm vindo a sofrer na perseguição aos homens armados da oposição.

Na sua resposta às perguntas dos deputados da oposição sobre a situação político-militar no país, o primeiro-ministro moçambicano, Carlos Agostinho do Rosário, afirmou que o chefe de Estado moçambicano pediu moderação às forças de defesa e segurança, para dar espaço ao diálogo.

“Os moçambicanos acompanharam com elevado interesse e satisfação a declaração do Presidente da República de Moçambique, que expressa a sua vontade genuína de alcançar a paz efectiva e estabilidade no nosso país”, afirmou Carlos Agostinho do Rosário.

O primeiro-ministro moçambicano disse nessa altura que o Governo espera que todos os atores políticos e sociais do país correspondam à vontade e abertura de Filipe Nyusi para o diálogo.

Recorde-se que também o anterior presidente moçambicano, Armando Guebuza, defendeu no dia 4 de Outubro de 2014 a desmilitarização urgente da Renamo e pediu às confissões religiosas para ajudarem na “implementação efectiva” do acordo de paz. Ou seja, fazer com o líder da Renamo o mesmo que, em Angola, o MPLA fez com o líder da UNITA.

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