O princípio da eficiência na Justiça

Tomando por pressuposto a composição da Suprema Corte brasileira – Supremo Tribunal Federal (STF) integrado por apenas 11 membros – e sua pauta assoberbada a não poder mais, é razoável que um ministro profira sua decisão ao longo de intermináveis horas?

Por Alexandre Pinho Fadel (*)

Não haveria um múnus público na actuação do STF a impor aos ministros maior concisão na exposição de suas razões? Quais são os custos e benefícios de um ministro dispor de uma tarde para fundamentar seu voto, diante das milhares de acções e recursos, de inegável importância, aguardando pauta para julgamento? Em tal situação, não estaria ocorrendo inaceitável desprezo do princípio da duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, CR)?

A obrigatoriedade de fundamentação das decisões judiciais também é princípio constitucional (art. 93, IX, CR). Deve, porém, se compatibilizar com outros princípios de idêntica relevância. Na situação em foco, podem-se apontar não somente o princípio da duração razoável do processo, mas também o princípio da eficiência (art. 37, caput, CR), vale dizer, a busca por melhores resultados possíveis ao menor custo possível – custo, aqui, entendido como a quantidade utilizada de um dos insumos necessários à lavra de decisões judiciais: o tempo. Assim, exposições mais concisas seriam mais responsivas à sociedade, tendo em vista o grande número de questões que estão embarreiradas aguardando julgamento.

O desrespeito à duração razoável do processo muitas vezes toma contornos dramáticos. No Brasil, não é raro que apenas os descendentes dos litigantes aufiram seus direitos e recebam o que era devido ao falecido autor da causa, por sucessão.

Em Angola, ganhou destaque a greve de fome de Luaty Beirão e outros activistas políticos – acusados de, supostamente, atentarem contra o Presidente José Eduardo dos Santos e planearem uma rebelião no país – em decorrência da morosidade de seus julgamentos.

Analisar os custos dessas longas sessões do Plenário é uma tarefa relativamente simples. Para cada hora em que um voto é minuciosamente pronunciado, uma hora da pauta é desperdiçada para solucionar outra controvérsia judicial. Por outro lado, avaliar os benefícios dessa prática parece ser algo bem menos objectivo. Dois “benefícios” se destacariam: redução de incertezas relativas à matéria e promoção de maior deliberação entre ministros.

Contudo, nem sempre uma longa fundamentação é esclarecedora. O máximo de motivação não está directamente relacionado ao mínimo de incerteza. Quando muitos fundamentos são trazidos por cada um dos onze ministros da Suprema Corte brasileira, identificar as razões determinantes do julgamento se torna uma tarefa extremamente complexa.

Em casos paradigmáticos, a decisão pode ser conhecida entre profissionais do direito, sem que se saiba ao certo por que se chegou àquele desfecho. Isso é um sintoma de incerteza quanto à ratio decidendi do caso, algo prejudicial à correta aplicação de precedentes. Do mesmo modo, se há incerteza entre os profissionais do direito, haverá incerteza entre os demais cidadãos.

Por outro lado, alguns estudos académicos demonstram a “impermeabilidade” dos membros do STF. Os ministros chegam à sessão com seus votos prontos. Durante a cansativa leitura, a regra é não haver debate. O espaço público divide-se em onze segmentos de uso privativo de cada autoridade, que, em alguns casos, sequer admitem interrupções – muito menos que haja deliberação.

Além disso, ao invés de haver enfrentamento dialéctico entre argumentos contrapostos, pedidos para longas vistas parecem mais atractivos aos ministros. Com frequência, membros do STF passam horas tornando públicas opiniões que restam não abrangidas pelo acordo formado. Razões dissidentes são importantes, desde que expostas como tais, e não como pretensamente corretas em meio àquelas que prevaleceram. Pagamos um elevado preço para ter, em contrapartida, uma grande confusão.

A crítica não se refere a nenhum ministro específico, mas a uma prática deletéria da própria Corte ao desempenhar o seu importante papel institucional. O actual rito de votação do STF custa caro ao Brasil e, ao que parece, não nos beneficia com redução de incertezas ou promovendo maior deliberação.

(*) Com Carlos Alberto Pereira das Neves Bolonha, Henrique Rangel, Igor de Lazari Barbosa Carneiro e Roberto Carlos Rocha Kayat

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