“Partidarização do Estado é o cancro do nosso regime”

No dia em que promoveu e participou numa manifestação de buzinão e panelaço, em Luanda, dia também em que o Presidente da República de Angola, José Eduardo dos Santos, comemorava 73 anos, William Tonet, jornalista, jurista e activista dos direitos humanos, defendeu no Angola Fala Só que em Angola a liberdade de imprensa é uma falácia e que o Presidente fez falso juramento, pelo que devia ser indiciado por esse crime.

W illiam Tonet respondia assim às questões do ouvintes do Angola Fala Só, acrescentando que o direito à manifestação e à reunião é um direito consagrado na Constituição da República, o qual a polícia “tem estado a violar de forma sistemática”.

O jornalista e director do jornal Folha 8 lembrou ainda que os manifestantes podem recorrer a “um instituto da Constituição que lhes permite resistir às autoridades, quando estas tentam impedi-los de se manifestar”, citando os artigos 1677 e 366 do Código Civil.

De acordo com Tonet, José Eduardo dos Santos também está a violar a Constituição, “quando prometeu cumprir e governar segundo a mesma, jurando-o na sua tomada de posse, e não está a fazê-lo”, explica o jurista defendendo que se trata assim de um “juramento falso, passível de ser indiciado como crime, com pena de 20 anos de suspensão de qualquer actividade política”.

“O nosso Presidente já não poderia governar”, ressalva.

MPLA tem medo da democracia

Questionado sobre liberdade de imprensa e a possibilidade da criação de uma associação da imprensa independente, afirma que a liberdade de imprensa “é uma falácia” e que de todos os órgãos de comunicação social privados, apenas estão fora do controlo do Estado o Folha 8 e o Crime. “Deixámos de ter uma imprensa independente entendida como tal. Todos os outros foram comprados pelo Estado. Estamos (Folha 8 e Crime) a resistir contra a supressão”, remata.

Para William Tonet, o controlo do Estado sobre a comunicação social “só acontece porque o MLPA não é um partido forte, é um partido cobarde, cuja a direcção actual é ainda mais cobarde, com medo da democracia”, acrescentando que se “a polícia fosse apartidária” as coisas podiam ter melhores contornos.

Ainda sobre a comunicação social e o seu papel, considera que os órgãos de comunicação social públicos são “partidocratas, que dividem os angolanos e não respeitam os ditames da profissão”, e que comunicação social privada “está a tentar que não se regrida ao tempo do monopartidarismo”.

“O que se tem vindo a fazer é um colonialismo político que vem sufocando de várias formas os angolanos”, disse.

Balanço da presidência de José Eduardo Santos

Num balanço da presidência de José Eduardo dos Santos, a propósito da data do seu aniversário, 28 de Agosto, Tonet considera ser uma “presidência triste”.

“O ano de 2002 vaticinou que o Presidente fosse ter uma postura distinta, capaz de visualizar Angola e os angolanos, ser Presidente de todos os angolanos e não apenas dos angolanos do MPLA. Mas [José Eduardo dos Santos] passou ao lado de ser uma referência política em Angola, que aprovou uma constituição que o favorece e está a exercer ilegitimamente”, justifica.

“Não temos um Presidente que pense em nome de todos os angolanos, isso inviabiliza que as leis possam ser devidamente aplicadas”, adianta.

Sobre novas obras e infra-estruturas levadas a cabo pelo Governo, o jornalista respondeu a um dos ouvintes que “o governo está ao serviço do povo, pelo que as escolas, hospitais, entre outros, não são um favor”.

“Não temos que agradecer o que o governo faz por nós. Temos que perguntar porquê só agora”, exclamou.

No que toca à justiça para todos, uma questão colocada pelo ouvinte Óscar Fernando, o jurista acredita que a lei que diz que “todos os cidadãos são iguais perante a lei é uma falácia” e que José Marcos Mavungo é um exemplo disso: “Está a ser julgado por pensar pela sua própria cabeça”.

Para Tonet, Cabinda é tratada como uma região “colonizada”: “É a única província onde é proibida a criação de associação de direitos humanos. Todas as outras têm, de uma maneira ou de outra, mas Cabinda não. Não há provas contra Mavungo”.

“Temos que lutar com inteligência, mas o governo está a levar-nos à saturação”

Também questionado sobre a crise económica em Angola, o jornalista que hoje promoveu uma manifestação pelos direitos dos angolanos, defende que a origem da mesma reside no facto das pessoas terem “usado e abusado dos dinheiros públicos para os seus projectos privados”, sendo possível vencer a crise se “os angolanos lutarem de facto com todas as suas armas e inteligência para contornar essa situação”, ressalvando que optar pela “confrontação militar” não deverá ser a melhor opção porque “o governo está preparado para isso”, contudo “está a levar-se o país a uma saturação”.

Sobre a prisão dos “15 + 1”, William Tonet chama-lhe “a maior besteira, maior baboseira daquilo que pode ser considerado a interpretação da lei, que nem mesmo um estudante de um ano consegue dar latitude à prisão dos activistas. Nunca a imagem de Angola esteve tão má”.

Tonet acusa ainda as igrejas de terem trocado a “sua acção cristã pela acção de dolarização, omissa quanto à situação dos angolanos” rematando que “a partidarização dos órgãos do Estado é o cancro do nosso regime, que só actua assim porque não confia nas suas capacidades, não é forte”.

Fonte Voz da América

http://www.voaportugues.com/content/angola-fala-so-william-tonet-partidarizacao-estado-cancro-nosso-regime/2935947.html

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