Odebrecht, Lula, Dilma e (é claro!) Eduardo dos Santos

Um conjunto de e-mails apreendidos pela Polícia Federal brasileira mostram a influência de Marcelo Odebrecht e os negócios que conseguiu. Instituto Lula diz que foram acções de “patriotismo” a favor da economia brasileira.

Por Ana Gomes Ferreira (*)

E -mails apreendidos pela Polícia Federal brasileira na investigação à teia de corrupção em volta da Petrobras mostram as pressões da empresa Odebrecht junto da presidência, quando esta era ocupada por Lula da Silva e depois por Dilma Rousseff, no sentido de esta empresa obter vantagens em contratos e ver colocados em cargos determinadas pessoas. Segundo os jornais O Globo e o Estado de São Paulo, que publicaram o conteúdos dos e-mails, essa pressão teve efeito.

Nas mensagens, o presidente da maior empresa de construção do Brasil, Marcelo Odebrecht – que se encontra detido –, tenta influenciar directamente o que será dito pelos presidentes a chefes de Estado de outros países. Numa mensagem de 2009 para executivos da construtora, o então ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Miguel Jorge, escreveu que Lula fez lobby pela empresa num dos encontros com líderes estrangeiros.

Em concreto, a Odebrecht quis evitar a escolha de um secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, que é considerado prejudicial à empresa. “Os documentos mostram, pela primeira vez, que o chefe de gabinete de Lula, Gilberto Carvalho, era um dos elos entre a empreiteira e o Presidente [Lula da Silva], de acordo com a interpretação da Polícia Federal”, escreve o Globo. No Governo Rousseff é Giles Azevedo, chefe de gabinete da Presidente, e Anderson Dorneles, assistente pessoal de Dilma, quem passaram a receber as mensagens de Marcelo Odebrecht.

As mensagens de Marcelo para Lula eram enviadas por meio de Alexandrino Alencar (também preso), director da empresa e mais próximo do então Presidente. Algumas mensagens tinham como título “Ajuda de memória”, outras “Agenda Lula”.

Os documentos obtidos pela polícia mostram que dias antes do encontro, a 5 de Junho de 2012, entre Dilma Rousseff e o Presidente da República Dominicana, Danilo Medina, Marcelo Odebrecht enviou a Giles Azevedo e Anderson Dorneles uma nota com sugestões para a agenda da reunião.

O jornal brasileiro cita o e-mail que diz ser “importante” a Presidente brasileira “reforçar” dois pontos na conversa: “a confiança que tem na Organização Odebrecht em cumprir os compromissos assumidos” e “a disposição de, através do BNDES [Banco Nacional para o Desenvolvimento Económico e Social], continuar a apoiar as exportações de bens e serviços do Brasil, dando continuidade aos projectos de infra-estrutura prioritários para o país”.

Numa entrevista que concedeu a jornalistas brasileiros após o encontro, o Presidente da República Dominicana diz ter recebido luz verde do Governo brasileiro para obter financiamento para a construção de duas fábricas no país — o projecto foi feito com financiamento parcial do BNDES; entre os anos de 2003 e 2015 empresas brasileiras conseguiram contratos na República Dominicana, com dois mil milhões de dólares (1,78 mil milhões de euros) a serem “desembolsados a favor da Odebrecht”.

Em 2005, na véspera de uma visita de José Eduardo dos Santos, Marcelo Odebrecht pediu a Lula da Silva que reconhecesse o papel do Presidente de Angola como “pacificador e líder regional”, e fizesse referência às acções realizadas por empresas brasileiras em Angola, com destaque para a Odebrecht. “Dr. Alex, aqui está o documento. O dr. Marcelo pede-lhe a gentileza de encaminhar ao seminarista”, escreveu Darci Luz, secretária de Marcelo, a Alexandrino Alencar. “Seminarista” surge sempre como nome de código para o intermediário das mensagens, que neste caso seria o chefe de gabinete de Lula, Gilberto Carvalho.

No dia seguinte, o Presidente brasileiro disse publicamente que Eduardo dos Santos “soube liderar Angola na conquista da paz” e elogiou a sua “perseverança e visão de futuro” – também mencionou o projecto da central hidroeléctrica de Capanda, referido no e-mail de Marcelo Odebrecht como um exemplo da cooperação entre os dois países.

Em 2007, Lula da Silva visitou Angola e, depois da análise dos e-mails, a Polícia Federal, citada pelo jornal Estado de São Paulo, conclui: “Aparentemente, os executivos da Odebecht mantêm contactos com autoridades da embaixada a fim de colocar na agenda, no encontro, assuntos de interesse da construtora”.

Há também e-mails que mostram Marcelo Odebrecht a participar activamente nas discussões sobre contratos da Petrobras.

A Lava Jato é uma investigação a uma gigantesca rede de corrupção que envolve a empresa estatal petrolífera, Petrobras, e o pagamento de subornos por parte de empresas para a obtenção de contratos. Envolve políticos do Partido dos Trabalhadores (no poder), mas também de outros. A investigação já levou à prisão de dezenas de responsáveis políticos – entre eles o ex-tesoureiro do PT, João Vaccari – , de administradores de empresas e de empresários: além de Odebrecht (entretanto envolvida também num caso de corrupção em torno da construção dos estádios do Mundial 2014 e condenada no Brasil por uso de trabalho escravo em Angola) está também detido o dono da construtora Andrade Gutierrez.

(*) In: Público

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