O Pravda e Luaty Beirão

O sipaio que dirige, com funções delegadas pelo chefe do posto, o Jornal de Angola, órgão oficial do regime do MPLA, continua a assinar textos produzidos pelos donos do reino. Hoje, entre outras barbaridades típicas da propaganda, diz que «o “caso” Luaty Beirão é um reflexo da política daqueles que fizeram a guerra e a propaganda de Savimbi.»

Por Orlando Castro

A ntecipemos um dos próximos textos do sipaio, provavelmente (como todos os que escreve) candidato ao Prémio Pulitzer.

Nele, lá do alto da sua copa privada, José Ribeiro, dirá que foi na Jamba que Luaty Beirão andou na escola da rebelião, e que lá “nunca existiu lei e nos palcos políticos que pisa, também não”. O sipaio não faz a mínima ideia do que foi a Jamba, no contexto histórico, militar, político, social e cultural da altura, mas quanto aos palcos políticos actuais é um mestre. Daí o dizer que nestes nunca existiu lei… a não ser a do MPLA.

“Nós queremos que os leitores saibam do que é capaz um indivíduo sem escrúpulos, sem princípios e sem moral que evoca a lei para continuar pactuar com graves violações ao direitos humanos denunciadas ao Jornal de Angola por pessoas que deram a cara chamando a atenção para o perigo de essas práticas prosseguirem em todo o país”, dirá o texto a ser parido pelos donos do reino e assinado por José Ribeiro.

Como os textos que aparecem no pasquim do MPLA, embora certamente escritos por outros, assinados por José Ribeiro, terá de ser ele responsabilizado (isto se, um dia talvez, Angola vier a ser um Estado de Direito), entre outras coisas, por defender exactamente para o nosso país o que o regime de Salazar defendia para… Angola. Ou seja, um regime colonialista onde impera a regra de que até prova em contrário… todos são culpados.

O sipaio, até porque deverá ter aprendido alguma coisa com os colonos portugueses, sabe que os seus patrões sonegam aos angolanos os seus mais elementares direitos, amordaçando pela força todas as tentativas de colocar a força da razão acima da razão da força. Mas, mesmo assim e compreensivelmente, tem de cumprir as ordens do dono.

Acabaremos um dia destes por ler que “Luaty Beirão, estendido ao comprido numa amálgama de palavras sem nexo, insinuações maldosas e raciocínios inconsistentes”, quer “impor ao país uma censura à verdade dos factos, acontecimentos e declarações de personalidades que são importantes para os cidadãos compreenderem o que de facto se passou e se passa em Angola”.

É certo que – mesmo sendo um eficiente sipaio – José Ribeiro nunca chegará sequer a chefe do posto. Aliás, quem nasce para ribeiro nunca chega (mesmo com o apoio do MPLA) a ser rio.

José Ribeiro afirmará em defesa dos (im)polutos patrões que os amigos de Luaty Beirão são os que “encomendam a morte de civis”, são os que “compraram explosivos e armas para destruir, por exemplo, a estabilidade de Cabinda”.

O sipaio acrescentará que os amigos de Luaty Beirão são também aqueles que assassinaram mais de 40.000 angolanos depois dos acontecimentos de 27 de Maio de 1977, acusados de serem apoiantes de Nito Alves.

Dirá ainda a criatura que “Luaty Beirão está habituado a dizer sobre as mais altas autoridades o que lhe vem à cabeça, sem contraditório”, mas que “terá agora que se habituar a partilhar esse palco com os que estão empenhados na paz e na reconciliação nacional. E que sabem que isso só é possível com verdade e não por trás do biombo dos falsos activistas dos direitos humanos”.

Curiosamente, na sua ânsia de ser mais do que um riacho, Ribeiro meterá água, ao falar de paz e reconciliação nacional. O sipaio estará a reconhecer e – mais do que isso – a contrariar as teses do seu patrão que, desde há muito, diz que está tudo bem, na santa paz do representante divino em Angola, de seu nome José Eduardo dos Santos.

Chegará a altura em que José Ribeiro dirá que Luaty Beirão tem as páginas do seu pasquim à disposição para dizer o que pensa. Para que não restem dúvidas, o Folha 8 garante a José Ribeiro todo o espaço que ele entender se quiser falar, entre outros, do massacre de Luanda que visou o aniquilamento e de cidadãos Ovimbundus e Bakongos, onde morreram 50 mil angolanos, entre os quais o vice-presidente da UNITA, Jeremias Kalandula Chitunda, o secretário-geral, Adolosi Paulo Mango Alicerces, o representante na CCPM, Elias Salupeto Pena, e o chefe dos Serviços Administrativos em Luanda, Eliseu Sapitango Chimbili.

Ou do massacre do Pica-Pau em que, no dia 4 de Junho de 1975, perto de 300 crianças e jovens, na maioria órfãos, foram assassinados e os seus corpos mutilados no Comité de Paz da UNITA em Luanda.

Ou do massacre da Ponte do rio Kwanza, em que no dia 12 de Julho de 1975, 700 militantes da UNITA foram barbaramente assassinados, perto do Dondo (Província do Kwanza Norte), perante a passividade das forças militares portuguesas que garantiam a sua protecção.

Ou de, entre 1978 e 1986, centenas de angolanos terem sido fuzilados publicamente, nas praças e estádios das cidades de Angola, uma prática iniciada no dia 3 de Dezembro de 1978 na Praça da Revolução no Lobito, com o fuzilamento de 5 patriotas e que teve o seu auge a 25 de Agosto de 1980, com o fuzilamento de 15 angolanos no Campo da Revolução em Luanda.

Ou de, em Junho de 1994, a Força Aérea ter bombardeado a Escola de Waku Kungo (Província do Kwanza Sul), tendo morto mais de 150 crianças e professores, bem como entre Janeiro de 1993 e Novembro de 1994 ter bombardeado indiscriminadamente a cidade do Huambo, a Missão Evangélica do Kaluquembe e a Missão Católica do Kuvango, tendo morto mais de 3.000 civis.

Sabemos e reconhecemos que tudo o que de mal se passa em Angola é hoje culpa dos jovens activistas, bem com dos que se juntam em vigília para preparar um golpe de Estado. Anteriormente a culpa era da UNITA, desde logo porque as balas das FALA (Galo Negro) matavam apenas civis e as das FAPLA/FAA (MPLA) só acertavam nos militares inimigos. Além disso, como também é sabido, as bombas lançadas pela Força Aérea do MPLA só atingiam alvos inimigos e nunca estruturas civis.

Como deve o sipaio estar feliz e agradecido ao seu dono. Não conquistou a carta de alforria mas saiu da jaula e pode vaguear (embora sob controlo) pelas copas das árvores ou das bissapas. Já é alguma coisa…

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