O Povo está (mesmo) farto

O Povo está (mesmo) farto - Folha 8

Os cortes na despesa pública em Angola para contrabalançar a descida das receitas, bem como a constante revelação de escândalos financeiros envolvendo familiares do Presidente da República, podem fazer aumentar as tensões sociais, tornando esta crise petrolífera num teste à “eficácia institucional” angolana.

“A descida nos preços do petróleo vai ser um teste fundamental à eficácia institucional de Angola, e as respostas totais das autoridades ainda não foram anunciadas; o impacto substancial das receitas em moeda estrangeira e uma taxa de câmbio em queda já estão a ser sentidas pela economia real, com pouca ou nenhuma nova actividade no sector privado a ser noticiada”, refere a agência de notação financeira Standard & Poor’s que hoje reviu em baixa o ‘rating’ do país.

“Alguns dos cortes na despesa pública que antecipamos podem aumentar as tensões sociais, principalmente considerando os altos níveis de desemprego”, escreve a agência de notação financeira S&P na nota aos investidores, divulgada hoje.

De acordo com um comunicado de uma das três maiores agências de ‘rating’ do mundo, a alteração segue-se a uma revisão também em baixa da evolução dos preços do petróleo até 2018, o que reduz as receitas de Angola e influencia a avaliação que os analistas fazem do país.

A S&P espera que o défice de Angola se deteriore significativamente, chegando a 5%, em média, entre este ano e 2017, o que contrasta com a expectativa de 1% de excedente das contas públicas em Agosto do ano passado.

Por outro lado, a perspectiva Estável de evolução reflecte, de acordo com os analistas da S&P, o conjunto de instrumentos financeiros à disposição do Governo e das autoridades monetárias para controlar o impacto de uma quebra prolongada dos preços do petróleo e, por conseguinte, das receitas fiscais.

O ‘rating’, diz a agência, tanto pode subir se as condições macroeconómicas melhorarem, nomeadamente se houver uma diversificação económica real, um crescimento económico maior que o esperado, uma melhoria substancial da capacidade institucional e da transparência, ou se existir uma flexibilidade monetária ou orçamental maior”.

Por outro lado, o ‘rating’ pode ser revisto ainda mais para baixo se “os efeitos adversos do choque petrolífero baixarem as perspectivas de crescimento a longo prazo” e se “a balança de pagamentos ficar pior que o previsto”.

Uma “deterioração do ambiente político ou institucional também pode resultar numa descida do ‘rating'”, avisa a Standard & Poor’s.

A Standard & Poor’s prevê que Angola cresça apenas 2,5% este ano, acelerando depois para 3,5% em 2016, e antecipa que a produção de petróleo fique abaixo do estimado pelo Governo.

“Esperamos que o crescimento fique na ordem dos 2,5% em 2015 e 3,75%, em média, entre 2015 e 2018”, dizem os analistas da S&P na nota enviada aos investidores, que explica a revisão em baixa da avaliação do crédito soberano em um nível, de BB- para B+, com perspectiva de evolução Estável.

A previsão de crescimento da economia angolana para este ano é significativamente abaixo da média dos últimos anos, que a S&P lembra ter sido de quase 5% ao ano entre 2011 e 2014, e da previsão rectificada do executivo, que aponta para uma expansão do Produto Interno Bruto na ordem dos 6,6%.

Por outro lado, as previsões são também negativas no que diz respeito à produção de petróleo, que vai novamente manter-se abaixo dos 2 milhões de barris por dia: “Incluímos também nas nossas previsões um aumento da produção de petróleo, de 1,66 milhões de barris por dia em 2014 para 1,73 milhões este ano, abaixo da expectativa do Governo de 1,83 milhões”, acrescenta o documento.

Os analistas da S&P reconhecem que desde 2009, o ano da última crise petrolífera, foram feitas “numerosas reformas”, mas a grande dependência das receitas petrolíferas condiciona a análise feita pela agência de ‘rating’, que antevê que o défice das contas públicas se inverta, passando de um excedente de 3,7% em 2014 para um défice de 7,5% este ano, e que a dívida pública ultrapasse os 30% do PIB, quando no ano passado se tinha ficado pelos 23%.

A explicação da S&P para a degradação do ‘rating’ de Angola incide também sobre os passos que o Governo vai dar nos próximos tempos, nomeadamente nos cortes à despesa pública que estão previstos: “Esperamos cortes significativos na despesa pública, subsídios e compras de bens e serviços, em cada uma destas categorias em valores que podem ir até aos 60%”, diz o documento.

A área em que a S&P também espera uma deterioração do ambiente económico é na política monetária, com a moeda nacional a poder sofrer uma desvalorização de 10% neste e no próximo ano face ao dólar, mas a agência nota que, entre 2011 e 2014, o kwanza valorizou-se 25% face à moeda norte-americana.

“Acreditamos que expatriar capitais tornou-se muito mais difícil, com o Banco Nacional de Angola a impor medidas restritivas. Notamos que a taxa de câmbio paralela é 30% mais fraca que a taxa oficial, e que há notícias de longas filas para obter um câmbio mais favorável; estas medidas pouco ortodoxas vão minar a confiança no sector empresarial e deprimir o investimento”, concluem os analistas.

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