(In)justiça em nome de quem?

A Justiça na sociedade castrense é administrada pelos Tribunais Militares em nome do povo, exercendo a função jurisdicional através do Plenário do Supremo Tribunal Militar (STM) e dos Tribunais Militares de Região, explicou hoje, quarta-feira, em Luanda, o juiz conselheiro brigadeiro Salvador da Silva.

Por Orlando Castro

S egundo a Angop, o juiz conselheiro do Supremo Tribunal Militar dissertou sobre o tema “Tribunal Militar como garantia da justiça”, dirigido aos oficiais das Forças Armadas Angolanas, no quadro das jornadas de defesa nacional, promovido pelo Instituto de Defesa Nacional.

“Decorre da Constituição da República de Angola que os tribunais são órgãos de soberania, com competência de administrar a justiça, em nome do povo angolano”, clarificou na ocasião o prelector militar.

Ficamos, assim, todos a saber que os tribunais deveriam ser órgão de soberania e, ainda, que deveriam agir em nome do povo. Falta saber se a soberania é a do país ou a do MPLA, se o povo é o angolano ou apenas o povo do MPLA e, ainda, se faz sentido num país com 13 anos de paz, que quer ser uma democracia e um Estado de Direito, ter tribunais militares.

Segundo o brigadeiro Salvador da Silva, os tribunais garantem e asseguram a observância da Constituição, das leis e demais disposições normativas vigentes, a protecção dos direitos e interesses legítimos dos cidadãos e das instituições, e decidem sobre a legalidade dos actos administrativos.

Adiantou Salvador da Silva que nas FAA, os Tribunais Militares asseguram a defesa dos pilares do edifício castrense, como sendo a disciplina e a hierarquia, na senda da manutenção da coesão dos seus efectivos, para o cumprimento da missão de defesa militar do país.

Não sei bem a razão, mas ao tomar conhecimento desta brilhante dissertação do brigadeiro Salvador da Silva lembrei-me da antiga chefe da contra Inteligência Externa de Angola, Maria da Conceição, que no dia 1 de Abril de 2008 entrou em greve de fome para protestar contra a indecisão judicial num processo de desobediência em que foi condenada pelo Tribunal Supremo Militar.

“A razão da greve de fome tem a ver com o silêncio dos órgãos judiciais angolanos que não se decidem em relação a este caso”, afirmou o seu advogado, David Mendes. Isto passou-se em 2008 mas, vendo bem as coisas, poderia passar-se em 2015. Os anos passaram, algumas moscas mudaram, mas a porcaria continua a ser a mesma.

Maria da Conceição foi condenada, a 20 de Setembro de 2007, num crime de desobediência pelo Tribunal Supremo Militar, na pena de dois anos e seis meses de prisão, processo que incluiu o ex-director dos Serviços de Segurança Externa, Fernando Garcia Miala, a quem coube a pena de quatro anos de prisão efectiva.

Por essa altura a defesa interpôs recurso junto do tribunal que a condenou. “Esgotaram-se todos os mecanismos legais e ela sente-se uma vítima do sistema judiciário do país que a faz manter-se na cadeia até este momento”, salientou nesse longínquo ano de 2008 o seu advogado. Longínquo? Sim. Já lá vão sete anos, mas a estratégia do regime continua actual.

O causídico admitiu na altura que a greve poderia ser suspensa “logo que houver uma decisão definitiva dos órgãos competentes”, porque a defesa interpôs “recurso com efeitos suspensivos”.

“Que seja definida a sua pena, aliás que a minha cliente seja condenada efectivamente ou seja posta em liberdade. E como não há nada de concreto ela enveredou pela greve de fome”, frisou.

Questionado sobre se a greve de fome da sua constituinte não afectará o seu estado de saúde, dado que a mesma já esteve internada depois de ser presa, David Mendes referiu que aconselhou-a a não entrar em greve de fome, mas esta “preferiu não acatar”.

Esta Maria da Conceição, como todas as Marias de Angola, como todos os Nitos, Luatys e Domingos do nosso país não devem nunca fazer greve de fome. É que, morrer por morrer como quer o regime, sempre podem morrer com a barriga mais cheia.

Artigos Relacionados

Leave a Comment