Empresas na corda bamba

Empresas na corda bamba - Folha 8

Com as receitas da venda de produtos retidas em Angola, na moeda local, devido à falta de divisas do país, as empresas portuguesas estão a recorrer mais aos bancos com ligações a este país para resolver dificuldades de tesouraria. Uma estratégia confirmada ao PÚBLICO por três instituições financeiras com presença nos dois mercados.

Por Luís Villalobos
PÚBLICO

L uís Mira Amaral, presidente executivo do BIC Portugal, o maior banco com capitais angolanos presente em Portugal, confirma que a falta de dólares, agravada de forma acentuada pela queda do preço de petróleo, levou a um aumento do número de clientes a solicitar o adiantamento de verbas a receber. Por outro lado, as dificuldades das empresas com negócios com este país africano são também uma oportunidade para as instituições financeiras, incluindo as que estão agora a começar as suas operações, como o BNI Europa.

O responsável afirma que a baixa do preço do petróleo “e o consequente aumento das dificuldades do Banco BIC Angola em conseguir comprar os dólares no Banco Nacional de Angola [BNA] levou a um aumento de clientes, grandes empresas, PME e particulares, que vêm ter connosco em Angola e Portugal para que possamos accionar mecanismos de adiantamento das verbas em Portugal”.

“Naturalmente que não poderemos certamente de um momento para o outro resolver todos os casos mas os dois bancos continuarão a trabalhar em conjunto para minimizar tais problemas aos nossos clientes”, acrescenta o gestor.

Por norma, explica Mira Amaral, nesta altura do ano “há sempre mais problemas na transferência de dinheiro para Portugal, dado que no período de Natal e Ano Novo a tradicional compra de cabazes por parte dos angolanos e a vinda de férias a Portugal colocam uma pressão adicional sobre a procura de dólares em Angola para transferência para Portugal”. Soma-se a estes factores a baixa do preço do petróleo nos mercados internacionais e o resultado são as actuais dificuldades acrescidas em fazer sair dinheiro deste país.

Normalmente, quando há dificuldade em conseguir os dólares necessários, explica Mira Amaral, e existem as devidas autorizações, o Banco BIC em Angola penhora a verba em kwanzas, emite uma garantia bancária ao Banco BIC português em dólares ou euros equivalentes e este financia o cliente (seja uma empresa ou um particular) nessa quantia em Portugal, efectuando um adiantamento.

Miguel Rola Costa, administrador e responsável pela gestão do Banco BNI Europa, que está a iniciar a sua operação em Portugal, explicita que “a dificuldade de obtenção de divisas no mercado angolano tem como efeito uma maior dificuldade das empresas exportadoras em poder manter o nível de serviço”.

Mais do que a demora do pagamento dos serviços e bens, acrescenta o gestor, o problema é “a incerteza relativamente ao momento em que tal possa acontecer”, com situações de estrangulamento no processo de gestão da tesouraria. Esta situação, diz, “tem levado a uma maior procura por parte das empresas” que querem resolver o problema da falta de pagamentos.

Já José Tavares Moreira, administrador do angolano BAI Europa, destaca ser “natural” que haja “alguma extensão dos prazos das operações contratadas, nomeadamente no caso das cartas de crédito”, até porque “a política dos próprios bancos angolanos é agora no sentido de estabelecer prazos de liquidação mais extensos para estas operações”.

Realçando que o banco não alterou a sua política face aos clientes, diz que também é preciso ter em conta, na actual conjuntura, “as prioridades definidas e os contingentes (quotas) estabelecidos pelas autoridades angolanas quanto à importação de bens, essenciais e outros”.

No caso do BNI Europa, a instituição financeira, que quer apostar nas PME, tem estudado várias soluções no actual quadro económico de modo a “contribuir para ultrapassar esta fase de maior dificuldade/pressão sobre a tesouraria das empresas”, quer com linhas de financiamento ligadas directamente às exportações quer com ferramentas de gestão de liquidez de curto prazo.

Os bancos não adiantam os valores que envolvidos nestas operações, que abrangem diversas tipologias de empresas, independentemente dos sectores em que operam. À partida, estas são operações sem grande risco, uma vez que o dinheiro existe (embora não possa ser movimentado), e representam um ganho para o banco, como ao nível de juros ou serviços cobrados.

O universo de potenciais clientes é vasto, já que existem quase 10.000 empresas a exportar para Angola, incluindo muitas PME, além de várias outras empresas que estão a investir no país, com diversos trabalhadores expatriados para este território africano. Angola é o maior mercado de Portugal fora da Europa, e o quarto maior a nível mundial. No ano passado, as exportações chegaram aos 3176 milhões de euros.

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