Em Moçambique ainda falam as armas

As confrontações dos últimos dias na Gorongosa, centro de Moçambique, provocaram uma nova vaga de deslocados, que pedem ao Governo e à Renamo para que “parem de brincar” com as suas vidas e apelam para o desarmamento da oposição.

“E stou muito chateado e enervado com estas coisas que estão acontecer. O Governo e a Renamo estão a maltratar-nos, porque nós não estamos a ficar sossegados. Estamos sempre com bagagens na cabeça e deixamos muitas coisas para trás”, disse à Lusa Ricardo Murtar, morador de Nhaulimbi, em Sadjundjira, na província de Sofala.

À semelhança de outras centenas de famílias, Ricardo Murtar, fugiu de casa com sete filhos e duas mulheres, após ter sido surpreendido por confrontos entre as forças de defesa e segurança e a guarda da Renamo na semana passada em Sadjundjira, nas encostas da serra da Gorongosa, onde o maior partido da oposição mantém uma base militar.

Murtar conta que conseguiu sair do “fogo cruzado” e fugiu mata adentro até chegar à vila da Gorongosa, onde se hospedou na casa de um familiar.

Esta região esteve no centro da anterior crise entre Governo e Renamo até ao acordo de cessação de hostilidades, assinado em Setembro de 2014, terminando um período que deixou um número desconhecido de mortos, milhares de deslocados e paralisou a economia local.

Quase 13 meses depois, quando alguns daqueles deslocados começavam timidamente a regressar às suas casas, a região voltou a ser palco de incidentes, nas operações em curso de desarmamento da Renamo.

“O Governo e a Renamo estão a brincar com as nossas vidas”, declarou Inoque Bica, morador de Vunduzi, com 27 anos e três filhos, e que pela segunda vez abandona as machambas, o que no passado lhe garantiu um período de fome.

“Estamos cansados de correr e ficar no mato, dormir no mato e comer mal. Estamos a construir casas de alvenaria, mas as obras não andam, porque são interrompidas sempre com conflitos políticos”, disse Mateus Pedro, outro residente em Vunduzi, que lembra amargurado a época que sobreviveu de mangas verdes após perder a produção agrícola devido ao conflito iniciado em 2013.

Os deslocados são unânimes em pedir diálogo político entre o Governo e a Renamo, para que “esta confusão acabe” e assim tirar a população da situação difícil em que se encontra, “com crianças e adultos a serem submetidos a condições desumanas de sobrevivência”.

São ainda favoráveis ao desarmamento da Renamo, desde que isso não afecte mais a população.

“O desarmamento da Renamo deve continuar, mas por meio de diálogo e não por troca de tiros porque isso estraga a população”, defendeu Ricardo Murtar, embora outros, como Inoque Bica, receiem que estas operações tragam mais violência para Vunduzi.

Viola Caravina, chefe do posto administrativo de Vunduzi, limitou-se a confirmar os confrontos da semana passada, escusando-se a comentar sobre a nova vaga de deslocados.

O ministro do Interior confirmou na semana passada novas operações das forças de defesa e segurança para recolher armas em posse da guarda da Renamo, em Gorongosa (Sofala) e Morrumbala (Zambézia), centro de Moçambique.

A polícia, disse Basílio Monteiro em declarações aos jornalistas na Gorongosa, “tem todo interesse que prossiga [a busca de armamento até desactivar o último ‘ninho’ [base dos militar da oposição] e deixe o país totalmente tranquilo”.

A Polícia iniciou a operação de recolha de armas da Renamo no dia 9 de Outubro, quando forças especiais cercaram e invadiram na Beira a casa de Afonso Dhlakama e prenderam por algumas horas sete elementos da sua guarda.

O cerco só terminou quando Dhlakama entregou 16 armas da sua guarda pessoal ao grupo de mediadores do diálogo entre a Renamo e o Governo e que por sua vez o deixou à responsabilidade da Polícia de Sofala.

A operação policial ocorreu um dia depois de o líder da oposição ter reaparecido na serra da Gorongosa, ao fim de duas semanas em parte incerta, na sequência de dois incidentes envolvendo a sua comitiva e as forças de defesa e segurança em Chibata e Zimpinga, província de Manica.

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